Porque nem só de pão vive o Homo Sapiens...

terça-feira, outubro 28, 2003

Terça-feira sofrida

sem Feira da Ladra nem raparigas a descer escada nenhuma a quatro a quatro, nem sequer ao pé-coxinho. Hoje tive de escrever uma notícia de economia. Socorro! Só mesmo ao som do Abrunhosa e com várias visitas ao Palavras da Tribo, onde andei a trocar postas com a Maria Poppe e comentários com a Isabel Ramos. A Maria, além de uma grande amiga, é irmã do António Poppe, que na quinta-feira dá um recital de poesia na Livraria Eterno Retorno, no Bairro mais Alto do Mundo. É às 22h e vou lá estar. Porque já estive doutras vezes, e há poucas pessoas que digam poesia como o Tó. E porque tenho umas saudades loucas da gente da Tribo.
PC

segunda-feira, outubro 27, 2003

Segunda-feira mitigada

pelo aniversário do meu companheiro de blogue (e pai, for the matter) e porque tenho metade do Mégalopolis de Herbert Pagani para ouvir quando chegar a casa. A primeira metade tomei-a ontem como vacina para a depressão pós-fim-de-semana. Agravada pela vitória do Partido Popular nas eleições para o governo da Comunidade de Madrid. Quero Sábado, depressa!
PC

quarta-feira, outubro 22, 2003

Catarina

O que se passou algures, num pequeno país chamado Portugal, em que a Catarina, de 3 anos, foi selvaticamente espancada, queimada com cigarros e batida, até morrer nos braços da polícia, mostra como algumas pessoas – políticos, profissionais de saúde, jornalistas, etc -, deveriam ter mais respeito quando perdem tanto tempo a falar de porcarias. Os abusos são, em 95% dos casos, cometidos em casa. As crianças abusadas sofrem perigo de morte, se não houver intervenção. Os abusadores têm que ser afastados e tratados antes de voltar a ter contacto com as crianças. Fartamo-nos de dizer isto, desde há mais de vinte anos. O que é que o senhor doutor Ferro Rodrigues e o Gastão têm a dizer sobre isto? Também irão fazer uma festa na Assembleia? A Catarina não era uma “presa pseudo-política”. Era uma criança de 3 anos, morta depois de barbaramente torturada, repetida e sadicamente, como o fazia a PIDE, a Stasi, os esbirros de Saddam, da Indonésia ou de Sharom. Soube disso aqui em Praga, pela net. E por uma jornalista do DN, extremamente comovida, que me telefonou. Assim como foram todos a correr para Castelo de Paiva, bem faziam em reservar um minuto de silêncio na AR. Para que não continuem a interessar-se só pelo que lhes interessa, em termos pessoais, de lobbies e de interesses de grupo. Ai, que vontade de dizer “porra!”.
MC

Et plus...

E “La chanson de Paul”, “Sarah”, “Le petit garçon”, “Les loups”, “L´absence”… plus rien a dire ! Talvez devêssemos prestar um bocadinho mais de atenção, novamente, aos autores franceses, à cultura francesa, à língua francesa. Sem desprimor para os excelentes autores ingleses, há línguas no mundo (e na Europa) que suplantam o pragmatismo e o universalismo british. “Ce soir, mon amour…” e não é preciso dizer mais! Com Jacques Brel, Georges Brassens, Georges Moustaki, Edith Piaf, Moulodji, Barbara, Serge Reggiani, Patrick Bruel, Patricia Kaas, Gilbert Bécaud, Charles Aznavour, Salvatore Adamo, Leo Ferré, Boris Vian, Jean Ferrat, Céline Dion, Charles Trenet, Jacques Dutronc, Marie Laforet, Mireille Mathieu, Sylvie Vartan, Yves Montand, Serge Gainsbourg e o sonho da nossa adolescência - Françoise Hardy. Querem mais razões?
MC

As voltas da chanson

Em Praga, com 3 graus negativos e chuva, a ouvir vezes sem conta. “La Dame Blanche”, com Georges Moustaki e Barbara “nos protagonistas”... ou “Ce soir mon amour”, do grande Reggiani que, em plena terceira (quarta?) idade lançou mais um disco. Ah, grande Serge. Outra chapelada nos que pensam que os neurónios se fundem com o passar dos anos, ou que a sabedoria dos velhos pode ser substituída por uma saltada à Internet. Força neles, compagnon de route. Velhos são os trapos!
MC

Malaio que não se presta...

Porventura ninguém terá reparado... mas eu vi, na BBC, em Praga, capital da República Checa, que dará para um texto maior um dia destes.
Mas, repito, porventura escapou dos vossos olhares o discurso do presidente da Malásia, na reunião que os países asiáticos tiveram com George W. Bush. Não sei se o homem é de direita ou de esquerda, se é um democrata de gema ou um ditadorzeco encapotado. Mas gostei do que disse, com um sorriso oriental, pleno de simpatia e de ambiguidade: “Mr President. We are ready to be exploited... but in a fair way, please”.
G´anda chapelada!
MC

terça-feira, outubro 21, 2003

"Cruzes!",

diz o canhoto PC ao ver o novo grafismo do blogue de J e N. Está mais bonito que dantes e continua interessante e divertido. Além de que alivia já não dizerem que estão no hospital. Chapelada prós canhotos, já!

Imprensa estrangeira II

Parece que afinal o Governo já não retira a publicidade da Time. Haja bom senso. Hoje Rui Moreira escreve no DN sobre este assunto.
PC

Imprensa estrangeira

O espectador (e meu grande amigo) Bernardo tem razão no que diz respeito ao exagero da Time, ao levar à capa da edição europeia o caso das prostitutas de Bragança. Discordo de que a reportagem de Amanda Ripley e Martha de la Cal se trate de "uma patética lição de mau jornalismo"; parece-me que o erro é antes dos editores, ao levarem o assunto à capa nos termos em que o fazem, igualando Bragança a Amsterdam (tomara nós ter uma Amsterdam, e faço notar que não o digo pelos bordéis nem pelos charros). Anyway, voltando à vaca fria (sem piada fácil), faço notar que o próprio Bernardo reconhece a "veracidade dos factos" - que ninguém contesta, nem sequer o parolo Governo que temos e cuja atitude foi, já aqui o disse, profundamente imbecil. Aconselho o artigo de José Vítor Malheiros no Público de hoje.

Na mesma posta, o Bernardo desanca o El País por causa de uma reportagem publicada no Domingo passado (não posso pôr linque porque é reservado a subscritores). Não quero ser acusado de caseirismo, pelo que começo por dizer que há vários erros que não se compreendem num jornal com o prestígio do El País, para mais quando a reportagem justificou, na óptica da sua Direcção, um enviado especial - Luis Gómez, que por acaso não conheço. O mais flagrante é talvez o da caracterização da Casa Pia como "instituição educativa mais prestigiosa" de Portugal. Mas, meu caro Bernardo, retira o inciso à frase e dir-me-ás se é mentira que "Os casos de pedofilia na Casa Pía hipotecam a agenda política do país". Ou, citando o mesmo artigo, que "a euforia de 1998 deu lugar a um pesadelo, repleto de maus augúrios". Ou que a mesma Casa Pia era, de facto, um colégio de horrores.

O maior mérito de Gómez é, para mim, apanhar o contraste entre o que era o ego de Portugal do guterrismo e as evidências que ninguém pode hoje negar (nem Arnaut com as suas retaliações que não roubam um minuto de sono aos editores da Time). O nosso país inebriou-se com "picos" como a entrada no primeiro pelotão do euro, a Expo98, o Nobel para Saramago, Timor, Porto2001, a organização do Euro2004, a eleição para o Conselho de Segurança da ONU, etc, e esqueceu-se de que estes episódios, a que não quero retirar valor, não bastam. António Barreto disse-o da melhor forma: não éramos um país rico com bolsas de pobreza, mas um país pobre com bolsas de riqueza. Recordemos Entre-os-Rios e a surpresa geral - aquilo passava-se a 30 km da Ribeira do Porto, por onde um sorridente primeiro-ministro passeara a contemplar o fogo-de-artifício inaugural da Capital Europeia da Cultura? O viaduto do IC19 é uma versão mais pequena - e felizmente sem os contornos trágicos - da malograda ponte de Castelo de Paiva. São, e não é Gómez o primeiro a utilizá-las, metáforas do nosso país.

Concordo com o Bernardo: nem tanto ao mar nem tanto à terra. Ou seja, nem o orgasmo nacional de finais dos 90 nem a depressão geral do início deste século nos servem de muito. Um e outra impedem-nos de resolver, a sério, os problemas estruturais de Portugal. Mas não nos piquemos tanto quando a imprensa estrangeira nos retrata os defeitos. Quando aqui cheguei queixava-me de que ignoravam o meu país. Agora já não, pelos piores motivos. Esses tem-nos dado Portugal.

PC

PS: Em relação à Galiza, não, Bernardo, não é preciso "lembrar o senhor Luis Gómez" - que, insisto, não conheço - do que por lá se passa. Nenhum jornal tem batido tanto nessa tecla como o El País, e não é só pela tendência antiaznarista que tão-pouco disfarça.

segunda-feira, outubro 20, 2003

Miguel Veiga

dava um bom PR, não dava?
PC

domingo, outubro 19, 2003

Obviamente, demita-se!

Desculpe, Dr. Ferro Rodrigues, mas se gosta realmente do PS, de Portugal e dos portugueses, se concorda que a democracia treme na falta de um governo bom, de uma oposição boa - e que esta tambem faz aquele -, se acredita que um seu qualquer outro compatriota vale tanto com o canídeo Gastão, e que a única oposição que tem feito tem sido falar e contra-falar sobre o caso Pedroso, então só lhe resta um caminho. Saia. Demita-se. Ceda o lugar a outros, que não estejam metidos na porcaria ate ao pescoço, seja porque o meteram, seja porque foi inábil para dela sair. Vá-se embora. Deixe o PS, os portugueses e Portugal em paz. Objectivamente, o senhor tem servido como um excelente aliado do Governo, ao dar cabo da única alternativa possível para governar Portugal. E tem sido profundamente incompetente no seu cargo de líder do maior partido da oposição. Não presta. Não serve. Exigiu a demissão de Portas, dos vários ministros, etc, etc. Chegou a hora de exigir a sua. Pegue na Embaixadora Ana Gomes e em mais uns quantos, e parta para umas (longas) férias. Com ou sem Gastão, coitado, que, ao menos, não está abaixo de cão!!!
MC

sexta-feira, outubro 17, 2003

Estou como a ASL,

ainda não me decidi a passar uma expressoless week. Ainda que ao retardador, porque aqui não se consegue comprar jornais portugueses, continuo a ler o calhamaço, sem saber bem porquê... Hoje, contudo, ao pegar na edição da semana passada, encontrei uma razão, ou melhor, duas. As capas do Actual e da Revista, com Nicole Kidman e Uma Thurman, valem os dois euros e noventa que nos chateia dar pela qualidade do jornal.
PC

quinta-feira, outubro 16, 2003

Regresso a “La pelota vasca”

Ví­tor Meirinho, leitor do Blógica, comenta uma posta minha sobre o filme do espanhol Julio Medem e o conflito do Paí­s Basco:

“Do meu ponto de vista, há sempre um facto que se esquece ao falar da questão política e terrorista no País Basco, e é para mim importantí­ssimo: a pequena dimensão da ETA (que faz uns cinco, seis ou sete mortos por ano), que não se corresponde em absoluto com a imagem de conflito terrí­vel que se pretende oferecer à  opinião pública espanhola e internacional. Quero dizer, acho que o problema do terrorismo é propositadamente manipulado pelo poder espanhol para, com a escusa de um imaginário «apocalipse terrorista» que dista de ser tal (sem por isso deixar de ser grave a morte de pessoas, obviamente) atacar as liberdades democráticas que cabe ter o nacionalismo basco em geral.”

Concordo e discordo. Vejamos porquê:

Ví­tor Meirinho tem razão no que diz respeito a algum aproveitamento por parte do governo de Aznar, que, de resto, tem inviabilizado toda e qualquer tentativa de diálogo com os nacionalistas não-violentos (PNV, Aralar, etc). O PP tem usado o conflito basco para tentar forçar o PSOE a aparecer de braço dado com o Governo, através de uma chantagem, segundo a qual quem não está com Aznar está com a ETA (argumento reproduzido também quanto à invasão do Iraque). Os socialistas não alinham a 100%, mas na maioria dos casos sim. Uma questão muito discutida foi a da ilegalização do Herri Batasuna, braço polí­tico da ETA. Havia argumentos fortes a favor (as subvenções públicas que o partido recebia iam direitinhas para os terroristas) e contra (assim elimina-se a possibilidade de entendimentos e empurra-se os nacionalistas moderados para conquistar o eleitorado radical). Confesso não ter certezas.

Quanto ao PNV (que lidera o governo regional de Euskadi), a sua atitude em relação à  ETA tem sido pusilânime. Entre a tentação de roubar votos ao Batasuna, a certeza de não fazer parte da lista de alvos a abater e a desculpa que lhe oferece, de bandeja, o nacionalismo também radical de Aznar, o PNV vai tentando levar a água ao seu moinho. Agora apresentou o chamado plano Ibarretxe (nome do actual presidente do governo basco, ou lehendakari), que quer fazer aprovar atropelando a Constituição, e para o qual são indispensáveis os votos, no parlamento basco, do Batasuna (a quem o PP e o PSOE querem, obedecendo aos tribunais, retirar direitos enquanto grupo parlamentar, coisa a que o PNV se opõe, com um apoio despropositado dos comunistas).

É complexa a situação no Paí­s Basco, e Medem tem, insisto, o mérito de mostrar isso mesmo. O desequilí­brio eventual do filme deve-se à  recusa do PP e da plataforma anti-terrorista ¡Basta Ya! em participar (o lí­der deste movimento, o filósofo Fernando Savater, veio recentemente dizer que, embora não tenha aceite o convite de Medem, acha que o filme não defende de nenhum modo o terrorismo).

O meu desacordo com o leitor refere-se à  pequena dimensão da ETA. Engana-se na estatí­stica: este ano morreram 3, no ano passado 5, mas em 2001 foram 15 e em 2000 foram 23 as ví­timas da loucura assassina da ETA, autêntico fascismo posto em prática.
É verdade que, graças à  Ertzaintza (polícia basca), em colaboração com a polí­cia francesa e com algum mérito do governo central, os terroristas têm sofrido baixas enormes, são hoje uma meia dúzia de tarados que matam por matar e já nem sabem bem o que defendem. Mas também é verdade que, para além da estatística, em Euskadi não se vive em paz nem em segurança. A qualquer momento a espada de Dâmocles pode cair-nos em cima. Há listas de gente a abater, há extorsão (a que os ignóbeis etarras chamam imposto revolucionário), há medo. Isto do ponto de vista da segurança. Do ponto de vista da convivência, a situação é igualmente má. Os governos central e regional, com o seu braço-de-ferro, dividem em vez de aproximar as fracções nacionalista e não-nacionalista da população. Da parte de Ibarretxe, até com algum racismo, uma espécie de mitologia de povo escolhido. Da parte de Aznar, com um espanholismo que não tem justificação e impede todo e qualquer pensamento diferente do seu. Dois extremismos que são alibi um do outro. Uma tristeza que se torna maior ao ver as paisagens e as pessoas que Medem filma.

PC

quarta-feira, outubro 15, 2003

Os cus e as calças (pelos tornozelos)

O Governo suspende a publicidade ao Euro2004 na revista Time, noticia o Público. A fonte é o gabinete do ministro adjunto do PM. O motivo? Esta reportagem sobre as prostitutas brasileiras em Bragança.

A notícia diz que o Governo está "a avaliar a situação criada pela reportagem". Ora eu li-a e, com a licença dos meus anfitriões pergunto ¿De qué cojones estamos hablando?

Comecemos pela reportagem. A história das raparigas, dos bares de alterne e das mulheres revoltadas está bem contada. A jornalista teve a preocupação de ouvir as prostitutas, as mulheres enganadas (autoras do manifesto Mães de Bragança), o dono de uma rede de casas de alterne, os homens que os frequentam, a polí­cia, o presidente da Câmara, sociólogos, gente dos serviços de imigração, etc. O resultado no interior é equilibrado, ainda que se note que quem a escreveu não conhece Portugal como a palma da mão. Dito isto, é exagerado o título Europe's new red light district na capa, até porque não tem correspondência com o conteúdo, além de dar a ideia que isto só se passa em Bragança. De resto, a própria reportagem deixa claro que o que diferencia este caso de outros é a reacção das mulheres (ainda bem que se mexeram, sem discutir os comos e os quês).

É triste (hoje como há séculos) a história de uma mulher que se dedica não sei quantos anos a um marido que prefere ir às putas. Na reportagem há pormenores cruéis (devidamente citados, não inventados), como o de alguém que compara o aroma exótico das brasileiras com o cheiro a gordura de uma dona de casa a fazer o jantar (idem para a forma fí­sica de uma e de outra). Não "caem bem" as gargalhadas do chefe da polí­cia local, que aconselha as mulheres a "fazerem-se mais interessantes para os maridos". Mas alguém se espanta que isto se passe no nosso paí­s, como em tantos outros? Onde está a ofensa, na verdade?!

Releio a reportagem, releio a notícia do Público e a atitude do Governo continua a parecer-me histérica e despropositada. E em relação ao Europeu, publicitem-no, porque a coisa já não vai famosa, nem no plano desportivo, nem no económico. Se resolverem manter o ar de virgens ofendidas, pelo menos invistam o dinheiro poupado na publicidade da Time numa coisa útil: comprem os árbitros do play-off Espanha-Noruega para que os nuestros hermanos se qualifiquem. De certeza que vêm mais espanhóis do que noruegueses, e sempre são mais uns euros que cá deixam.

PC

PS: Detalhe delicioso na reportagem: ...Portugal's traditional, mournful fado music, a sort of blues-opera hybrid that weaves together vocals and string instruments...

segunda-feira, outubro 13, 2003

Progresso e Teoria da Evolução

Atenção, Bernardo, porque a posta em que desancas o progresso incorre num equívoco. Não vou hoje entrar no debate sobre o progresso propriamente dito (outro dia, na blogosfera ou num jantar no Bairro Alto), mas fazer umas observações quanto à teoria da evolução das espécies, que também desancas. Cá vamos:

1. Comecemos por sublinhar que a teoria da evolução das espécies é de Darwin - o primeiro a sistematizá-la, com ideias anteriores - mas já passaram uns anos desde a viagem do Beagle (1831-1836), as Galápagos e os tentilhões. Já houve tempo para alguma crítica e alguma análise e, sobretudo, para que os conhecimentos entretanto adquiridos possam ajudar a dar mais consistência à teoria ou a iluminar aspectos pendentes da mesma. A química também já não é só Lavoisier, nem a física Newton, e até há um português que desdiz ditos de Einstein. Uma abordagem actual da evolução é a do americano Stephen Jay Gould, falecido no ano passado.

2. O erro em que me parece que cais - como muita gente - é o de atribuir à teoria da evolução das espécies uma ideia que não faz parte dela: a de que as mudanças são para melhor, ou que há uma direcção, um sentido (um fim?), tal como se estivéssemos num processo linear destinado ao tal Super-Homem de que falas. Nada que se pareça. Na raiz desta ideia errada está a concepção errada da evolução como uma adaptação progressiva determinada pelas mudanças do meio. A ser esse o caso (insisto, não é) a evolução teria um sentido, um objectivo, mas ainda assim ele não seria o de conseguir super-homens, antes seres vivos o mais adaptados possível ao meio em que viviam. Mas Darwin) não diz que as mudanças do meio determinam as mudanças nos seres vivos, mas sim que as mudanças no meio determinam quais variedades - de entre muitas pré-existentes - singram ou não.

3. De onde vêm, então, estas mudanças? No tempo de Darwin não havia conhecimentos suficientes (foi antes de Mendel) sobre genética, mas hoje, felizmente, hé-os. Não só se conhecem os mecanismos de transmissão hereditária como se conhecem os fenómenos mais ou menos extraordinários que ocorrem durante o mesmo. As mutações genéticas são, como dizes, raras. São a excepção, sim senhor. E ainda por cima, muitas são, desde logo, incompatíveis com a vida. Ou seja, as que produzem mudanças na descendência de um dado ser vivo são ainda mais raras do que tu dizes. E claro, as que (por casualidade!) levam a que um organismo esteja melhor adaptado a um meio que mudou (ou não, mas essa é uma variável independente da dita mutação), serão ainda menos. Agora explica-me: porque raio é que isso serviria de argumento contra a teoria da evolução das espécies?! Talvez o facto de a selecção natural demorar milhões de anos a actuar tenha que ver com isso, não?! É por isso que as cobras têm cintura pélvica residual, os cavalos uma espécie de unha a meia-altura das pernas, e os Homens dentes do siso (em progressivo, desculpa o adectivo, desaparecimento).

4. "Mais sofisticado" não significa melhor. Poderá querer dizer "mais adaptado ao meio", segundo as características deste. De forma contingente. Stephen Jay Gould batia muito nesta tecla.

E chega, que a posta vai longa e não quero que se torne em posta de bacalhau. Sobre o progresso, a democracia, o Papa, a iraniana, discutiremos noutra altura. A propósito, manda um abraço ao Duarte por esta posta e toma tu outro por esta, ainda que um abraço amigo não precise de ter uma posta como pretexto.

PC

domingo, outubro 12, 2003

Ah, grande selecção!

A palavra "Selecção", segundo o Dicionário de Sinónimos da Porto Editora (passe a publicidade) quer dizer: apuramento, combinado, selecto, distinção, eleição, escolha, predilecção, separação e triagem.
Não sei se o Dicionário errou - creio que não -, mas as palavras "vergonha", "buracos", "falhanços", miséria" e "desgraçadinhos" não constam da lista.
Mas foi o que vimos e temos visto, neste grande campeonato que Scolari, sim, o mesmo que aparece com ar entusiástico a falar às multidões, com uma assinatura final de mestiçagem entre o Euro 2004 e o logotipo da campanha do Governo, resolveu realizar, já que não estávamos na fase do apuramento. Os outros que se esgadanhem, que se torçam que dêem o litro. Nõs temos adversários poderosíssimos para os treinos: ele é o Casaquistão, ele é a Albânia, ele é... a liga dos reumáticos e o team dos saci-perêrês... e mesmo assim, lá ganhámos. Cinco a três. O grande Ricardo estava inspirado, graças a deus... se não era como com os Camarões - de 5-0 a 5-5, e só não deu "al ajillo" porque o jogo acabou...
Não basta investir em estádios ultra-formidáveis, que nem os Rolling Stones esperavam, de tão bons. Não basta desenrolar tapetes de relva holandesa para substituir a relva bichada do grande Estádio Lagartáxia XXI. Não basta os espaços para os anões, na catedral, e para os invisuais, no outro lado da Circular - e quiçá pra os surdos, no Estádio do Dragão... só falta. Investir num bom treinador, num bom seleccionador que não escolha o 3º guarda-redes do Porto podendo ter o 1º, investir numa equipa (que não é um mero somatório de estrelas). Scolari não vai fazer grande "scola". Filipão mais parece um filipinho. Ah, grande pátria nossa amada. E ainda dizem que o futebol é o ópio do povo.... quanto a drogas, realmente, estamos conversados...
MC

sexta-feira, outubro 10, 2003

Boa escolha

Ainda bem que o Comité Nobel atribuiu o Prémio Nobel da Paz à activista iraniana Shirin Ebadi. Uma boa surpresa, quando tudo levava a crer que o premiado seria o Papa. Embora reconheça esforços de ecumenismo a João Paulo II, merece-me muitíssimas reticências. A esta senhora conheço-a pior, mas o trabalho que tem desenvolvido é difícil, perigoso e extraordinário. Impulsionar reformas no mundo islâmico é do mais importante que se pode fazer pela Humanidade nestes tempos. Impulsioná-las na Igreja Católica também não é dispiciendo, sem querer chover no molhado, a prestação de Karol Wojtyla neste ponto deixa muito a desejar.
PC

quinta-feira, outubro 09, 2003

Ite, missae est.

A propósito dos acontecimentos dos últimos dias - ministros que estavam a preparar o dia seguinte e vêem-se despedidos (com "justa causa", diga-se), ex-ministro que está preso e sai por um acórdão que já devia ter sido dado há semanas (dura lex, sed lex, e aplica-se a todos, ex-ministros ou ministros, com o mesmo rigor e implacabilidade), estudante que sonhava com a entrada numa faculdade (e já dava como "favas contadas") e porque vive num Estado de direito e em democracia, vai ter que ir aprender para outro lado... e, se calhar, tanta gente que pensava estar bem e descobriu uma doença grave, ou tantos que tinham perdido a esperança e adquiriram novos rumos e novos graus de liberdade. Enfim. Tudo tem um sentido, mesmo as coisas de sentido duvidoso. E lembrei-me de um texto que escrevi há muito tempo. Aqui fica, para os nossos visitantes bloguistas.
MC

Amanhã um novo dia
E entre o sol e o nevoeiro, a paz e a discórdia, o consenso e o conflito, o feio e o bonito, um novo átomo nascerá, um sonho será permitido, uma página nova aberta e despertos os sentidos.
Para que possamos cometer outros erros, que não os mesmos, porque essa é a maravilha e a marca indelével da imperfeição das pessoas e da condição humana, no percurso eterno do aperfeiçoamento a caminho do infinito e da utopia.

"Simplesmente observamos o que se passa",

dizem eles. Mas nós sabemos que fazem muito mais que isso. Bernardo Sanchez da Motta e Duarte Fragoso são bons amigos e acabam de lançar um blogue. Dizem-se "espectadores" para que acreditemos que apenas assistem ao grande teatro do Mundo. Mas um espectador pode aplaudir, ressonar, apupar, patear ou até atirar uns bons tomates podres se a trupe não estiver à altura da distinta plateia ou, de forma mais pragmática, do preço dos bilhetes que, a bem dizer, não anda barato. Vai valer muito a pena ler o blogue do Bernardo e do Duarte. Os dois primeiros dias prometem. Provocadores, polémicos e de uma grande honestidade intelectual, dão vontade de dizer "posso não estar de acordo com as suas ideias, mas lutarei para que possa exprimi-las" (era mais ou menos isto, nãao era?). Além de merecidas e entusiásticas boas-vindas à blogosfera, queremos dedicar-lhes um poema. Para não arriscarmos a pele, abstemo-nos de submeter à altíssima bitola dos Espectadores os nossos escassos dotes de vates da batata. Preferimos delegar - e perdoem a repetição - em SG (Gigante, que não Light). Muito a propósito, aqui fica o Espectáculo.

ESPECTÁCULO (in Campolide, 1979)

Quando
tu me vires no futebol
estarei no campo
cabeça ao sol
a avançar pé ante pé
para uma bola que está
à espera dum pontapé
à espera dum penalty
que eu vou transformar para ti
eu vou
atirar para ganhar
vou rematar
e o golo que eu fizer
ficará sempre na rede
a libertar-nos da sede
não me olhes só da bancada lateral
desce-me essa escada e vem deitar-te na grama
vem falar comigo como gente que se ama
e até não se poder mais
vamos jogar

Quando
tu me vires no music-hall
estarei no palco
cabeça do sol
ao sol da noite das luzes
à espera dum outro sol
e que os teus olhos os uses
como quem usa um farol
não me olhes só dessa frisa lateral
desce pela cortina e acompanha-me em cena
vamos dar à perna como gente que se ama
e até não se poder mais
vamos bailar

Quando
tu me vires na televisão
estarei no écran
pés assentes no chão
a fazer publicidade
mas desta vez da verdade
mas desta vez da alegria
de duas mãos agarradas
mão a mão no dia a dia
não me olhes só desse maple estofado
desce pela antena e vem comigo ao programa
vem falar à gente como gente que se ama
e até não se poder mais
vamos cantar

E quando
à minha casa fores dar
vem devagar
e apaga-me a luz
que a luz destrouta ribalta
às vezes não me seduz
às vezes não me faz falta
às vezes não me seduz
às vezes não me faz falta.


Depois há uma parte linda só com piano. Chapelada para os Espectadores. Um abraço!
PC

quarta-feira, outubro 08, 2003

Não foi por unanimidade,

como diz Ivan Nunes. O relator do acórdão votou vencido. Seja como for, SIM, é uma boa notí­cia a libertação de Paulo Pedroso.
PC

Gosto da nova MNE!

E sabe bem ver o Governo passar de duas a quatro mulheres.
PC

A "frente facho-canhota contra as praxes",

que lançaram Statler e Animal, publicou recentemente o seu epitáfio, pertinente como as postas anteriores sobre o assunto. De resto, soube há dias que deste lado da península também se fazem praxes universitárias. Chamam-lhes "novatadas" e chegam a ser tão alarves e fascistóides como as nossas. Por abominar esse monumento à imbecilidade, aqui vai uma letra do inigualável SG, que "desanca a praxe".

MAÇÃ COM BICHO (in Lupa)

O tempo passa
e lembras com saudade
o saudoso tempo da universidade
foste caloiro
e quintanista
já comes caviar
esquece o alpista

P`ra entrar na universidade
é preciso
prender o humor
na gaiola do riso
ter médias altas
hi-hon, ão-ão
zurrar, ladrar
lamber de quatro o chão

Mas há quem ache
graça à praxe
É divertida (Hi-hon)
Lição de vida (Ão-ão)
Maçã com bicho
acho eu da praxe
É divertida (Mé-mé)
Lição de vida (Piu-piu)
Maçã com bicho
acho eu da praxe


Chamar-se a si mesmo
besta anormal
dá sempre atenuante ao tribunal
é formativo
p`ró estudante
que não quer ser popriamente
um ingnorante

Empurrar fósforos com o nariz
tirar à estupidez a bissectriz
eis causas nobres
estruturantes

eis tradição
sem ser o que era dantes

Não vou usar
mais exemplos concretos
é rastejando
que se ascende aos tectos?
Então vejamos
preto no branco
as cores da razão
porque a praxe eu desanco


Chapelada para SG e que o próximo álbum não tarde!
PC

terça-feira, outubro 07, 2003

Afinal Martins da Cruz também saíu.

De manhã emitiu um comunicado a dizer que não se demitia, mas a reconhecer que o serviços do seu ministério tinham tentado suscitar mudanças na lei do acesso ao ensino superior que - objectivamente, sem entrar em processos de intenções - favoreciam a sua filha. Ainda por cima, a dita proposta (mais tarde recusada pelo Ministério da Ciência) deu entrada depois do requerimento pedido pela filha de Martins da Cruz. Muitos estariam (conto-me entre eles) dispostos a dar o benefício da dúvida, mas a suspeita pairaria sempre sobre o MNE. Fez bem em sair. Aliás, com o que se percebeu hoje nem tinha alternativa. Mas insisto, se o tivesse feito ao mesmo tempo que Pedro Lynce, não lhe tinha ficado nada mal. Até se tinha evitado a salada russa de "consciências tranquilas" e "palavras de honra" finalmente desbaratadas.
PC

segunda-feira, outubro 06, 2003

Tal é o sectarismo de Luís Delgado

e o seu afã de defender tudo quanto o Governo da direita faz, que acaba a desprestigiar quem quer defender. O colunista escreve no DN que Pedro Lynce se demitiu "pela pressão mediática de 36 horas" e que, reflectindo 48 se vê, claramente visto, que o ministro não tinha nada que se demitir. A lição que o Governo deve retirar do caso é, acrescenta Delgado, que tem de "ser menos reactivo aos fluxos informativos", para não "sacrificar os mais aptos".
Esta interpretação começa por ser desprestigiante para Lynce. Ao atribuir a demissão exclusivamente à  pressão dos media, Luís Delgado está a negar ao ministro, automaticamente, a dignidade com que aquele assumiu as suas responsabilidades, ou, melhor dito, a falha em cumpri-las. A reacção do Governo é  notícia da excepção-que-não-tinha-que-ser foi correcta (sublinhe-se que Durão Barroso nem sequer tentou demover Lynce).
Luís Delgado achava melhor que não se tivesse sabido nada? E que uma pessoa, por ser filha de um ministro (sem querer culpá-la de nada!), entrasse em Medicina enquanto milhares de alunos que tinham tanto direito como ela ao regime de excepção (ou seja, nenhum) ficavam a ver? Ou que, sabendo-se, e abdicando a filha do MNE de ocupar a vaga, todos agissem como se nada fosse? Do género "pois, isto soube-se, era mal feito, já desfizemos, ponto final"?! Não é evidente que, caso a notícia não tivesse saído, a coisa ia mesmo para a frente?!
Luís Delgado não percebeu nada, e a prova é o argumento dos "mais aptos" que evoca. A qualidade da governação de Lynce não é para aqui chamada. O ministro não sai por incompetência política, logo a sua eventual boa performance (questão que deixo de fora de propósito) não serve para criticar a demissão. Isto é aristotélico.
Resta Martins da Cruz. Há quem pense (até no PSD) que, pelos mesmos motivos - ou por simples solidariedade para com Lynce, que a merecia -, também devia ter apresentado a demissão. Não vou tão longe, acredito na palavra de honra que deu. Não gosto do MNE, mas não me choca que fique no Governo. Agora, se Martins da Cruz tivesse feito o mesmo que Pedro Lynce também não me tinha chocado nada.
PC
PS: Já depois de escrever esta posta chegou-me o Expresso, cujo director, José António Saraiva, esgrime argumentos iguais aos de Luís Delgado (ou vice-versa, já que o Expresso saíu no sábado e o DN a que me refiro na segunda-feira). Assim, o comentário vale para ambos.

sábado, outubro 04, 2003

A filha do Ministro e a futura médica, a ministra sueca e, claro, o cão Gastão

Brevemente: há uma regime, considerado "de excepção" - ninguém explicou porquê - que autoriza certas pessoas a entrar na Universidade, passando sobre os outros todos. Independentemente das médias que tenham tido. Curiosamente, filhos de pessoas que são nomeados para lugares de grandes ordenados e consequentes mordomias.
Mas até o "regime de excepção" pode ter excepções, dependendo do regime.
Ela pediu, ele deu parecer e remeteu ao respectivo Ministro (atenção: a palavra "ministro" quer dizer" servidor dos outros"). O Ministro viu que era uma excepção, mas "excepcionou". Ela entrou. Ia ser minha aluna daqui a 6 anos. Mas a SIC recebeu a informação - ah!, grandezas e misérias da democracia - e pôs no ar.
Viu-se o resultado: o ministro não estava de má fé, OK, mas excedeu-se. Ela, coitada, vai estudar para o estrangeiro - já não vai ser minha aluna, mas desejo-lhe uma brilhante carreira e os maiores êxitos, porque o que ela pediu estava correcto, só que devia ter sido indeferido... O pai jura que não meteu cunhas, e eu acredito na palavra de honra de um homem, mesmo não gostando muito dele. O outro, mesmo de boa fé, demitiu-se.
Ah! A democracia funciona. Um dia uma ministra social democrata sueca saíu à rua e foi comprar fraldas para a filha. Era a futura lider do partido. Ao chegar à caixa do supermercado, viu que se tinha esquecido do cartão de crédito pessoal e usou o do governo, porque a filha assim o justificava. No dia seguinte, a primeira coisa que fez foi fazer uma transferência da conta pessoal para a conta oficial, do valor das fraldas (estamos a falar de cerca de 15 euros). Soube-se. E foi forçada a demitir-se e a desistir de ser líder do partido e futura primeiro-ministro. Porquê, perguntarão... porque ceder num milímetro é o primeiro passo para ceder num metro ou num quilómetro.
Pedro Lynce fez o que devia, mas não merece, nem críticas, nem elogios. Fez... "just did".
Martins da Cruz jura que nunca meteu cunhas. Pela sua honra. Acreditemos. Que continue...
A filha pôs um requerimento. Fez o seu papel. Que não seja penalizada por isso e que seja uma grande médica, que o País precisa (se ela quiser voltar). Não vai ser minha aluna, e não sabe o que perde por não passar pelo nosso departamento...
Que lufada de ar fresco!
MC
PS: que a oposição não exagere e não aproveite o filão para colmatar as suas insuficiências e incompetências
PS2: será que Ferro teria feito o mesmo por Gastão????

sexta-feira, outubro 03, 2003

Atenção,

que vem aí uma colecção de música francesa com Brassens, Reggiani e Gainsbourg, entre outros. Ao que parece, a cada um dos 'clássicos' é dedicada uma caixa de 3 CD's + 1 livro. Um suspiro de alívio no fim de uma semana de cão... bom fim-de-semana!

PS. ao falarmos de cão, não queríamos, de forma nenhuma, ofender o Gastão, o ícone de esquerda deste País, o libertador da Pátria, o canídeo mais famoso da história das Oposições. Gastão über alles! E o Ferro que se cuide, ou teremos um futuro PM com tracção às quatro patas!!!!
MC e PC

quinta-feira, outubro 02, 2003

As postas e os marretas assinalados / que de um ocidental blogue lusitano...

Ó ASL, os Marretas não estão nada desaparecidos desde sábado! Têm postado todos os dias e andam a fazer uma paródia divertidíssima aos Lusíadas do Expresso, reconheça-se com fair-play. É isso e a "frente facho-canhota anti-praxe", à qual já aderi, na ala canhota, bem entendido. A sério, vale a pena ler esta posta, e esta, e aqueloutra. Ah, e já há mais uma!
PC

quarta-feira, outubro 01, 2003

Back to IC-19

João Serrano, grande amigo dos 'bloguistas da batata' e deputado municipal socialista na Amadora, recorda num comentário enviado ao Blógica a saga do tabuleiro do IC-19. Nas suas palavras, “há cerca de dois meses a estrutura pedonal ficou abalada por mais de um toque de uma grua e camião TIR”, de que o presidente da Câmara de Sintra deu conhecimento ao Instituto de Estradas de Portugal. Para reparar o tabuleiro, acusa, foi seleccionada “uma empresa com reduzida experiência de trabalhos deste tipo”, porventura por ser a de preço mais baixo. “A obra não tinha projecto, nem os necessários documentos técnicos, exigidos por lei para trabalhos de engenharia, nem plano de segurança e saúde”, acrescenta.

O Departamento de Estradas de Lisboa (DELIS) pediu apoio à Área Funcional de Obras de Arte e Estruturas Especiais, que sugeriu “a substituição da (s) viga (s) danificadas, ou em caso limite, que se fizesse um projecto de reparação”. O DELIS despachou em concordância, mas “nada foi feito”, diz João Serrano.

“Para o Sr.º Ministro Carmona Rodrigues a queda da ponte pedonal do IC19, que provocou três feridos, foi uma «situação de azar». Para este Governo é azar existir em Portugal 160 pontes com falta de manutenção e 40 em risco”, afirma João Serrano. E dá como exemplos a ponte da Goncinha, na ligação Faro-Loulé, à espera de obras desde 2001, e um relatório do Instituto de Estradas de Portugal que afirma que na ponte situada no Nó de Sandim, na EN 107, foi detectada “uma deficiência no apoio das cascas (pré-fabricadas em betão armado pré-esforçado) no pilar central que obriga a uma intervenção imediata”. “No mesmo IC-19, três pontes pedonais situadas aos quilómetro 7,9, 9,5 e 10 estão a exigir intervenção a «médio prazo». Todas elas estão apoiadas em vigas pré-fabricadas em betão armado e pré-esforçado. O acesso ao Norte de Odivelas/Ramada (perto do IC 22), deve ser observado com detalhe.” , acrescenta.

Para João Serrano, é “muito azar que este Governo tenha feito significativos cortes em pessoal e investimento no IEP, quase o desmantelando, com base na cega politica de combate ao deficit”. Os cortes no PIDDAC para o distrito de Lisboa são de 30%, e no capítulo de obras de conservação atingem os 50%. Além disso, assegura, o Governo “despediu cerca de 200 funcionários do IEP, sendo que mais de metade eram técnicos qualificados” e que “a Brigada de Conservação das Estradas para os Concelhos de Oeiras, Sintra, Cascais e Amadora, tem apenas 1 técnico (aliás à beira da reforma) quando o mínimo exigido eram 8 técnicos. Único técnico que alias não pode fazer mais de 12h extraordinárias por mês”.

Finalmente, sublinha, o Governo substituiu o presidente do IEP, Ribeiro dos Santos, por João Sousa Marques, que era vice-presidente do primeiro e tinha pedido demissão pelos mesmos motivos. João Serrano afirma que o novo presidente do IEP era responsável pela área de conservação, exploração e segurança rodoviária, pelo que "tinha sob sua responsabilidade directa as obras que decorriam na ex-ponte pedonal do IC19".

Conclusão de João Serrano: “O azar deu direito a prémio. O Governo demonstra que o seu critério é premiar a incompetência e a irresponsabilidade. O verdadeiro azar dos portugueses é terem este Governo”.

(editado por PC)